O aumento no uso da bicicleta está ganhando
espaço nas discussões sobre mobilidade urbana. E antes que digam que estou
propondo transformar as cidades brasileiras em versões chinesas da década de 70
do século passado, a resposta é um sonoro não.
Uma alternativa de transporte barata e saudável, mas
que requer apoio e incentivo para se tornar realidade tanto nas grandes como nas médias cidades.
O singelo ato de ir e vir transformou-se em questão de máxima
prioridade nos centros urbanos. Mobilidade nas cidades brasileiras é pauta
diária e dor de cabeça permanente para 10 em cada 10 prefeitos de grandes e
médias cidades brasileiras. O tema entrou até mesmo nas discussões sobre
qualidade de vida, em razão dos poluentes emitidos pelos veículos e o
sedentarismo. Além, é claro, dos acidentes causados, principalmente, por
motoristas inconsequentes que matam mais pessoas dos que nos casos de
homicídio.
O histórico privilégio dado ao automóvel pelos gestores públicos
e, mais recentemente, a sua real popularização – graças ao maior acesso a
financiamentos e queda nos preços – transformaram o trânsito nas cidades insuportável.
A opção pelo transporte individual, felizmente, tem sido
bastante questionada. Aos prefeitos ficou, então, a difícil missão de
implementar mudanças necessárias e urgentes para fazer fluir o tráfego de
pessoas em suas áreas de atuação. O problema é o que fazer e como fazer. Em
geral, após décadas de soberania de obras visando atender aos carros, quaisquer
medidas tomadas por esses prefeitos ou são caras ou desagradam a parcelas
consideráveis da população. A construção de metrôs e monotrilhos, faixas
exclusivas de ônibus e a restrição ao uso do automóvel, para ficar em algumas
das mais importantes medidas, já são suficientes para acabar com o sono de
muitos alcaides Brasil afora, especialmente em São Paulo e Rio de Janeiro.
Alternativa de baixo
custo. Mas vale a pena pensarmos que também existem alternativas que,
apesar de exigirem mudanças de hábitos e comportamentais, são muito mais
baratas e com ótimos resultados para a qualidade de vida das pessoas.
O aumento no uso da bicicleta está ganhando espaço nas
discussões sobre mobilidade urbana. E antes que digam que estou propondo
transformar as cidades brasileiras em versões chinesas da década de 70 do
século passado, a resposta é um sonoro não.
A ideia central é colocar a bicicleta como uma boa alternativa
para viagens mais curtas e, em outros casos, interligadas com o transporte
público. Aliás, para que seja possível estabelecer essa comunicação entre
bicicleta e transporte público será preciso investir para capacitar estações de
trem e metrô com estacionamentos seguros, facilidades de acesso e de transporte
de bikes nas próprias composições. Isso tem ocorrido em São Paulo, de maneira
tímida, é verdade, e com alguns retrocessos difíceis de entender. Os baixos
valores aplicados nesse tipo de obra não justificam tantos vacilos e falta de
determinação.
Aliás, por falar em
investimentos, a construção de ciclovias e espaços para pedestres é mais barata
se comparada com vias para carros, trens e metrôs. O portal de mobilidade
urbana publicou um estudo sobre
o tema realizado pela organização norte-americana Bycicle Coalition, tendo como base a
cidade de São Francisco nos Estados Unidos.
A pesquisa constatou que uma milha de ciclovia (cerca de 1,6 km)
sai em média por 455 dólares, e a mesma distância de uma estrada custa 571 mil
dólares. A organização conclui que apostar em obras de infraestrutura para
bicicletas não compromete o orçamento das cidades, ainda mais quando comparadas
à construção de vias para carros.
Grande negócio. Para muitos ainda pode parecer coisa de criança, mas quando
entramos também na questão econômica, o negócio da bicicleta assume outra
dimensão. Hoje o Brasil é o 3º maior produtor de bicicletas do mundo, atrás
apenas da China e da Índia, conhecidos países em que suas populações usam a
bicicleta como meio de transporte.
Nosso país também é o 5º maior consumidor de bicicletas no
planeta, mas ficamos bem abaixo quando a análise verifica o consumo per capita.
Nesse caso passamos a ocupar a 22ª colocação entre os países do mundo. Vale
lembrar que países europeus e suas belas cidades tem em seu cenário cotidiano
pessoas de todas as classes sociais fazendo uso da bicicleta como meio de
transporte.
E para que os nossos números
possam melhorar, um dos aspectos a serem verificados é o do valor. O Brasil tem
hoje uma das magrelas mais caras do mundo, enquanto a compra de carros tem sido
muito facilitada. Para mudar essa realidade existe inclusive um movimento da rede Bicicleta para todos que pede ao governo um IPI
Zero para bicicleta (petição on line ).
Se levarmos em conta o atendimento aos seus principais usuários,
o IPI Zero poderá tornar a vida das pessoas de baixa renda muito melhor.
Segundo o IBGE, perto de 1/3 dos que se utilizam da bicicleta como meio de
transporte no Brasil tem renda familiar de até 600 reais e outros 40%, de até
1.200 reais. O texto da petição faz referência exatamente aos benefícios que
essa população irá receber: “são estes os brasileiros mais afetados pela alta
tributação, que tolhe o acesso a um produto de mais qualidade e com valores
mais justos, favorecendo a migração para outros meios de transporte,
especialmente os motorizados”.
Estudos divulgados pela Associação Brasileira da Indústria,
Comércio, Importação e Exportação de Bicicletas, Peças e Acessórios (Abradibi)
constataram que ao zerar o IPI, hoje na casa dos 10% do valor pago pela bicicleta,
o Brasil teria um aumento de 11,3% nas vendas.
A bicicleta, portanto, é uma boa alternativa, barata e saudável.
Mas para que se torne uma real possibilidade de transporte, também será preciso
garantir a segurança dos ciclistas para que as bikes ocupem e transformem a
paisagem de nossas cidades e quem sabe consigamos construir um futuro mais
humano e sustentável.
* Reinaldo Canto é jornalista especializado em Sustentabilidade e Consumo
Consciente e pós-graduado em Inteligência Empresarial e Gestão do Conhecimento.
Passou pelas principais emissoras de televisão e rádio do País. Foi diretor de
comunicação do Greenpeace Brasil, coordenador de comunicação do Instituto Akatu
pelo Consumo Consciente e colaborador do Instituto Ethos. Atualmente é
colaborador e parceiro da Envolverde, professor em Gestão Ambiental na FAPPES e
palestrante e consultor na área ambiental.
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