terça-feira, 31 de agosto de 2010

Perigo no trajeto

Estudo
Pesquisa em Londrina reforça a necessidade de prevenção para evitar acidentes a caminho do trabalho
29/08/2010

O número de acidentes de trabalho que ocorrem fora do ambiente da empresa é expressivo em Londrina e a ausência de notificação aponta para um universo muito maior de casos. Pesquisa realizada pela enfermeira Renata Baldo revela que, do universo entrevistado por ela, um terço de pessoas que foram atendidas pelo Siate e encaminhadas para hospitais de Londrina foram vítimas de acidentes de trabalho, e mais da metade no trânsito, indo ou voltando do trabalho ou em horário de almoço. Nenhum desses acidentes, de acordo com a pesquisa, foi notificado ao Sistema Único de Saúde (SUS), o que a pesquisadora aponta como um problema a ser vencido. A pesquisa foi realizada entre julho e dezembro de 2008 e defendida em tese de mestrado em junho deste ano.
Renata Baldo afirma que a pesquisa mostra “que antes de ter resolvido o problema da prevenção dos acidentes ocorridos no interior dos locais de trabalho, os envolvidos com a Saúde do Trabalhador precisam assumir um novo desafio: o de abrir uma frente de luta pela prevenção de acidentes ocorridos no espaço da rua”.
Outro ponto relevante, segundo ela, é a identificação do acidente de trabalho de forma mais específica e sua notificação para o desenvolvimento de políticas públicas adequadas. “Já apresentamos os resultados [da pesquisa] no Conselho Municipal de Saúde, há duas semanas, e o promotor Paulo Tavares ficou de marcar uma reunião com o presidente da CMTU para passarmos essas informações”, disse.
O promotor de Garantias Constitucionais, Paulo Tavares, afirma que a pesquisa traz informações a mais para a questão da mobilidade urbana, já em discussão pelo Ministério Público, Acil, Ippul e empresas de ônibus. “Temos que atuar em várias frentes: aperfeiçoar [a campanha] o ‘Pé na Faixa’, fazer trabalhos educativos, melhorar o transporte coletivo para incentivar o trabalhador a usar mais os ônibus; ter mais ciclovias.”
Paulo Tavares diz que já entrou em contato com o diretor de Trânsito da CMTU, Wilson de Jesus e aguarda uma agenda para que a pesquisa seja apresentada. “A pesquisa mostra que as motos estão sendo cada vez mais usadas pelo trabalhador e precisamos pensar nestas ações, pois os acidentes de trabalho estão acontecendo nas ruas.”
Notificações
A Lei nº 8.213/91 determina no seu artigo 22, que todo acidente do trabalho ou doença profissional deve ser comunicado pela empresa ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), no caso de trabalhadores no mercado formal, sob pena de multa em caso de omissão. Essa notificação é feita por meio de emissão do Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT), que é um formulário que deve ser preenchido pelos hospitais. De acordo com a pesquisa, dos 465 casos de acidentes de trabalho atendidos nas ruas pelo Siate, 300 eram pessoas que estavam no mercado formal. Destes, apenas 178 disseram que houve a emissão do CAT.
Hospitais devem estabelecer fluxo de notificação ao SUS
Um dos objetivos da pesquisa, segundo Renata Baldo, é contribuir para que sejam desenvolvidos trabalhos para que os hospitais façam a notificação dos acidentes ao Sistema Único de Saúde (SUS). “As doenças contagiosas, por exemplo, são todas notificadas. No caso de saúde do trabalhador isso também tem que acontecer. Para isso é importante estabelecer o fluxo de notificação [para onde deve ser encaminhada: vigilância epidemiológica, sanitária, centro de referência de saúde do trabalhador]”, diz.
Essa dificuldade não é realidade apenas de Londrina. De acordo com a pesquisa de Renata Baldo, em 2008, no Brasil foram feitas 750 mil notificações de acidentes de trabalho fora da empresa ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). No entanto, o número levantado pela pesquisa representa apenas um quinto das ocorrências; já ao SUS não foi feita nenhuma notificação.
Hospitais
O JL entrou em contato com os maiores hospitais de Londrina. O Hospital Evangélico (HE), por meio de assessoria, informou que todos os meses os acidentes de trânsito, de trabalho e de trabalho no trânsito são protocolados na Diretoria de Auditoria, Controle e Avaliação (Daca) e repassados ao SUS e INSS pela supervisora de convênios, Denise Moraes. Em 2010, até 25 de agosto, o HE registrou, 97 acidentes de trabalho no trânsito e 100 acidentes de trabalho.
O Hospital Universitário (HU), por meio da assessoria de imprensa, informou que em 2010 foram 46 notificações, entre janeiro e agosto e que, no entanto, nem sempre, os acidentados informam que estavam em trabalho ou no trajeto. A Santa Casa, também por meio da assessoria de imprensa, informou que o hospital está se mobilizando para fazer as notificações ao SUS.
Campanha reduziu ocorrências e custos com acidentados
Em 2008, período que a pesquisa foi realizada, a Santa Casa de Londrina estava atenta aos problemas de acidentes de trabalho ocorridos no trajeto. Segundo a analista de Recursos Humanos, Renata Gusmão, que na época era presidente da Cipa, 32% dos acidentes de trabalho no hospital ocorriam no trajeto. De nove acidentes/mês, três ocorriam fora do hospital. As ocorrências eram no trânsito, saindo do ônibus, de bicicleta, entre outras. Isso gerava em média 30 dias de afastamento do trabalho por mês e um custo com funcionário acidentado, de R$ 625, de acordo com Renata.
Piloto automático
Foi, então, desenvolvida uma campanha de conscientização, a “Vá e volte bem”. Durante uma semana foram distribuídos folhetos e realizadas palestras para ressaltar a importância de manter a atenção no trajeto. “Normalmente, como se trata de um caminho que a pessoa conhece bem, pois faz todos os dias, ela liga o piloto automático e daí acontecem os acidentes”, afirma Renata. “No período após a campanha reduzimos pela metade esse percentual”, conta Renata. Dos três acidentes/mês no trajeto passou para em média um por mês. O período de afastamento/mês caiu para 10 dias e os custos para R$ 256,00. No semestre de 2010 a média de acidentados no trajeto se manteve um/mês.
Franciele Ronchini, 22 anos, não é funcionária da Santa Casa, mas já se acidentou indo para o trabalho. Ela conta que em 21 de maio, estava na Avenida Arthur Thomas (zona oeste) quando um carro atravessou a preferencial. Foram vários dias sem trabalhar. Hoje, segundo ela, os cuidados redobraram. “Fico muito mais atenta a tudo que está acontecendo no trânsito”, conta.

Reportagem do Dia 29/08/2010

http://www.jornaldelondrina.com.br/edicaododia/index.phtml?data=2010-08-292023:00:00

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